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Os 3 Adventos

João Pedro Pita

Começámos no passado Domingo o tempo do Advento, este período de preparação para o Natal. A palavra Adventus, em latim, significa “chegada”, “vinda”. É o tempo em que a Igreja se prepara para a vinda de Jesus. Tal como quando esperamos alguém especial na nossa casa em que arrumamos, preparamos tudo com alegria, também o Advento é este tempo de espera, de preparação e de alegria. Muitas famílias começam já a montar o presépio e a árvore de Natal. Hoje multiplicam-se os calendários do Advento, mas originalmente este tempo convidava a propósitos de fé, oração e conversão.

As origens do Advento remontam ao século IV, especialmente na Gália e na Península Ibérica e chegou mesmo a ter seis semanas, à semelhança da Quaresma. Era frequente que muitos catecúmenos se preparassem durante o Advento para receber o Baptismo na Epifania (Dia de Reis e Baptismo de Jesus), festa que celebra a manifestação de Jesus Cristo como Deus encarnado. Um dado curioso é que a Epifania, celebrada a 6 de janeiro, é liturgicamente mais antiga que o Natal pois começou a ser celebrada um a dois séculos antes.

Foi o Papa São Gregório Magno (590–604) quem estabeleceu as quatro semanas de Advento que ainda hoje celebramos. O Advento possui também um carácter penitencial, muitas vezes esquecido: por isso a cor litúrgica é o roxo e não se canta o Glória na Missa. Este hino de louvor voltará apenas na noite de Natal, juntamente com os sinos da Igreja.

Mas o que muitos desconhecem é que há vários Adventos. No Advento celebramos dois Adventos, ou melhor, duas vindas de Jesus. O Advento possui quatro semanas, ou seja, quatro Domingos. Os dois primeiros orientam-nos para a segunda vinda de Cristo, daí as leituras com carácter apocalítico e escatológico; o terceiro é o Domingo da alegria (gaudete em Latim), daí a vela e as vestes rosas que exprimem esta alegria antecipada: o Senhor está próximo; e por fim, o quarto Domingo que prepara a solenidade do nascimento de Cristo, o mistério da Encarnação.

São Bernardo de Claraval ainda acrescentou um terceiro advento: a vinda quotidiana: “A primeira, quando Ele veio por Sua Encarnação; a segunda é quotidiana, quando Ele vem a cada um de nós, pela Sua graça; e a terceira, quando virá para julgar o mundo”.  In Obras completas de San Bernardo. Madrid: BAC, 1953, p. 177.

Primeiro Advento – O Natal. A Vinda na História, na carne (Adventus in carne)

Como proclamamos no Credo: “Por nós, homens, e para nossa salvação, desceu dos céus e encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem Maria, e Se fez homem.”

Neste primeiro Advento celebramos o Natal, a vinda de Cristo na carne como anunciava o profeta Isaías: “Uma jovem virgem conceberá e dará à luz um filho, e o chamará de Emanuel”, que quer dizer “Deus Connosco.” (Is 7,14/ 8,10)

Jesus nasceu em Belém na pobreza, humildade e silêncio. “Aniquilou-se a Si mesmo, assumindo a condição de servo” (Fl 2,7). Este primeiro advento marca o início da salvação da Humanidade.

Segundo Advento – A Vinda Final, a Parusia (Adventus in majestate)

Como proclamamos no Credo: “E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os mortos; e o seu reino não terá fim…. E espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo que há de vir”

Neste segundo celebramos a vinda futura de Jesus na sua glória no final dos tempos como Rei e Juíz da Humanidade, daí ser celebrado depois da festa de Cristo Rei do Universo. Cristo virá restaurar todas as coisas e dar cumprimento final ao Reino de Deus.

Há dois mil anos que a Igreja vive na expectativa da segunda vinda, por isso no Advento repetimos: “Maranatha!” que significa: Vem, Senhor! Queremos apressar a vinda definitiva d’Aquele que nos dará a vida e alegria em plenitude. Neste Advento percebemos que história não caminha ao acaso, Cristo é o destino e a plenitude da história: Deus é a origem e o fim do mundo e da nossa vida.

“Homens da Galileia, porque estais assim a olhar para o céu? Esse Jesus que vos foi arrebatado para o Céu virá da mesma maneira, como agora o vistes partir para o Céu.” (Actos 1, 11)

“Pois muitos virão em meu nome, dizendo: ‘Sou eu’; e ainda: ‘O tempo está próximo.’ Não os sigais. Quando ouvirdes falar de guerras e revoltas, não vos alarmeis; é necessário que estas coisas sucedam primeiro, mas não será logo o fim (…) Haverá grandes terramotos e, em vários lugares, fomes e epidemias; haverá fenómenos apavorantes e grandes sinais no céu. (…) antes de tudo, vão deitar-vos as mãos e perseguir-vos, entregando-vos às sinagogas e metendo-vos nas prisões (…) Haverá sinais no Sol, na Lua e nas estrelas; e, na Terra, angústia entre os povos (…) Então, hão-de ver o Filho do Homem vir numa nuvem com grande poder e glória. Quando estas coisas começarem a acontecer, levantai a cabeça, porque a vossa redenção está próxima.” (Lucas 21)

Este segundo advento marca o fim da salvação da Humanidade.

Terceiro Advento – A Vinda no Presente (Adventus in Spiritu)

Neste terceiro Advento, também chamado espiritual, místico ou intermediário, celebramos a vinda de Cristo hoje, continuamente, ao nosso coração, às nossas almas com a sua graça santificante como Jesus prometeu: “Eis que estou convosco todos os dias, até ao fim do mundo.” (Mt 28,20)

Jesus vem à nossa vida, pelo Baptismo, pela Eucaristia e outros sacramentos como a Confissão; vem pela Sua Palavra que deve ser meditada; pelos irmãos, especialmente os pobres; e pelas circunstâncias concretas em que somos chamados a amar.

Este Advento é decisivo: de nada vale celebrar o Natal se Cristo não nascer dentro de nós, na nossa vida quotidiana, se não tivermos uma vida espiritual profunda de amor a Deus e ao próximo. A santidade quotidiana é o objectivo deste Advento que marca o início da nossa salvação pessoal.

Quarto Advento – A Vinda de Cristo na Hora da Morte

Alguns autores referem ainda um quarto Advento, unindo o segundo e o terceiro:

a vinda de Cristo no momento da nossa morte, quando cada pessoa O encontra face a face. Outros colocam-no como uma alínea ou do Advento Espiritual na nossa vida ou do Advento Final, tanto do mundo como da nossa vida. Aqui decidi separar para aprofundar.

“Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós; pois esse dia cairá como uma armadilha sobre todos os habitantes da terra”. (Lucas 21, 34-35)

O Papa Francisco sobre isto diz-nos: “vem também um convite à sobriedade, a não sermos dominados pelas coisas deste mundo, pelas realidades materiais, mas antes a governá-las. Se, ao contrário, nos deixarmos condicionar e dominar por elas, não podemos perceber que há algo muito mais importante: o nosso encontro final com o Senhor: e isto é importante. Aquele, aquele encontro. E as coisas de todos os dias devem ter este horizonte, devem ser orientadas para aquele horizonte” (Angelus, 27 de Novembro de 2016).

Assim recordamos que Cristo vem também ao nosso encontro pessoal definitivo. “Hoje estarás comigo no Paraíso.” (Lc 23,43) e que devemos estar preparados para este momento, para esta vinda. A nossa vida eterna joga-se neste Advento que marca o fim da nossa salvação pessoal.

Por tudo isto, vemos que o Advento é muito mais do que uma contagem decrescente para o Natal. É um tempo em que recordamos:

•           Cristo que veio – no Natal, na humildade.

•           Cristo que vem – agora na nossa vida, na graça.

•           Cristo que virá – na glória, no fim dos tempos

o          (E ainda) Cristo que vem ao nosso encontro na morte.

Viver bem o Advento é aprender a reconhecer estas presenças e deixar que cada uma transforme o nosso coração.

João Pedro Pita | Pastoral